domingo, 29 de março de 2015

AINDA ASSIM, EU ME LEVANTO

Você pode me riscar da História 
Com mentiras lançadas ao ar.
Pode me jogar contra o chão de terra,
Mas ainda assim, como a poeira, eu vou me levantar.
Minha presença o incomoda?
Por que meu brilho o intimida?
Porque eu caminho como quem possui
Riquezas dignas do grego Midas.
Como a lua e como o sol no céu,
Com a certeza da onda no mar,
Como a esperança emergindo na desgraça,
Assim eu vou me levantar.
Você não queria me ver quebrada?
Cabeça curvada e olhos para o chão?
Ombros caídos como as lágrimas,
Minh'alma enfraquecida pela solidão?
Meu orgulho o ofende?
Tenho certeza que sim
Porque eu rio como quem possui
Ouros escondidos em mim.
Pode me atirar palavras afiadas,
Dilacerar-me com seu olhar,
Você pode me matar em nome do ódio,
Mas ainda assim, como o ar, eu vou me levantar.
Minha sensualidade incomoda?
Será que você se pergunta
Porquê eu danço como se tivesse
Um diamante onde as coxas se juntam?
Da favela, da humilhação imposta pela cor
Eu me levanto
De um passado enraizado na dor
Eu me levanto
Sou um oceano negro, profundo na fé,
Crescendo e expandindo-se como a maré.
Deixando para trás noites de terror e atrocidade
Eu me levanto
Em direção a um novo dia de intensa claridade
Eu me levanto
Trazendo comigo o dom de meus antepassados,
Eu carrego o sonho e a esperança do homem escravizado.
E assim, eu me levanto
Eu me levanto
Eu me levanto.
ANGELOU, Maya. Still I Rise. Tradução de Mauro Catopodis.

domingo, 1 de março de 2015

Emília escandalosa, um perigo à moral e aos bons costumes.

Emília Amália Pinto de Magalhães, a mãe de Aluísio Azevedo, era uma bela rapariga branca, nascida em Lisboa, filha de um bem sucedido comerciante, viveu sua adolescência e juventude em São Luís do Maranhão, protegida e resguardada tal qual um ostensório de ouro, no aguardo de um "bom casamento" (bom para o pai dela claro). Antes de completar os dezessete anos foi apresentada ao seu noivo, um português branco e esperto nos negócios, garantia de uma vida segura e confortável, dentro dos padrões de conforto e decência da sociedade luso-brasileira do século XIX. Obediente, submissa e resignada, Emília Amália aceitou seu desígnio, apesar do sofrimento que sentia. Percebendo o que significava ser casada e percebendo-se imersa em um típico casamento tradicional, pautado na moral e nos bons costumes machistas brasileiros, Emília Amália surpreendeu seu marido, sua família e toda a "boa sociedade" de São Luís ao abandonar o marido, levando consigo a filha pequena, primogênita do casal. A sociedade ficou escandalizada com o atrevimento da senhora dona Emília Amália e passou a repudiá-la, a rechaçá-la, atentando inclusive contra sua vida, afinal de contas uma mulher com esse tipo de comportamento era uma ameaça aos valores e bons costumes daquela gente tão amante da retidão. O preço do pecado é a morte, pois então, morte à pecadora! Como tudo passa e já naquele tempo a memória dos brasileiros e das brasileiras já era curta, tempos depois, a poeira se assentou e dona Emília Amália, de volta à "boa sociedade", conheceu o vice-cônsul de Portugal, o senhor David Gonçalvez de Azevedo, que a tomou por esposa, passaram a morar amancebados no centro da cidade, provocando outro escândalo, atraindo novamente a hostilidade da sociedade maranhense contra Emília Amália. Apesar de o vice-cônsul ser viúvo, tiveram de viver amancebados, pois a senhora ainda era casada com seu abandonado marido. Meus mais profundos respeitos à dona Emília Amália e a seu amásio, o senhor David Azevedo, por todos os escândalos causados à sociedade de São Luís do Maranhão, pleno século XIX. (Tânia Rezende, em Confissões de Bertoleza).