sábado, 4 de outubro de 2014

Toda feminista é uma mulher desrespeitada

Para dialogar com o texto "Toda feminista é mal amada", disponível em: . Acesso em: out. 2014.

Em tempos de reconstrução das identidades, é necessário desconstruir verdades, ou seja, os discursos que circulam publicamente e são reproduzidos e repetidos, nunca questionados. É preciso desafiar esses discursos, buscando contra significados para seus conceitos e suas máximas. Pensando nisso e refletindo sobre minhas experiências e sobre minhas observações etnográficas sistemáticas, preparei este texto, inspirada pelo texto "Toda feminista é mal amada", para promover um diálogo, principalmente, com mulheres situadas em uma dimensão espaço-temporal marcada por estratégias humilhantes de diminuição da mulher. Por isso, vou começar com algumas pérolas machistas, consideradas verdades e usadas como arma, principalmente contra as poderosas.

Você não sabe mexer com homem ou você não sabe como tratar um homem. 

Acho que toda mulher está acostumada a ouvir as duas (des)apreciações de homens diferentes ou do mesmo homem em momentos diferentes. Todas nós conhecemos esse antigo aconselhamento: você toma as decisões, resolve tudo, mas sempre faça de conta que é ele quem está mandando. É educação feminina para a manipulação do homem. Há ainda mil uma estratégias para agarrar e para segurar o homem . O homem nunca tem de fazer nada para segurar a mulher. É mais ou menos por aí. Vamos às desconstruções e contra-leituras.

O que significa saber ou não mexer com homem? Trata-se de saber, mesmo? Não há escolha? Ou a mulher sabe ou ela não sabe? E se, mesmo sabendo, a mulher não quiser? Ela não tem o direito de não querer? O resultado das minhas observações, de algumas entrevistas e rodas de conversas, além das muitas leituras que fiz sobre o assunto, mostra que a maioria dos homens tem um sentido para isso, mas as mulheres têm muitos sentidos, orientados por seus objetivos com a conquista. Fica a dica, aqui, acordem, seres do milênio passado: toda mulher sabe e muito bem mexer com homem, se ela quiser, quando ela quiser e com quem ela quiser. Antes de dizer a uma mulher que ela não sabe mexer com você, pense duas vezes pra não pagar mico, pois pode ser que ela, de fato, não quer nada com você; e pode ser que se trata de uma mulher que exerce o seu direito de não querer um homem, de não querer se sacrificar nem se anular para segurar o homem, que já não lhe atrai em nada. Isso é um direito, sim. Não é só homem que enjoa de mulher com o tempo, a mulher também enjoa do homem, só que ela é preparada para se anular e aguentar a situação, o homem, não. 

Conheço e conversei com várias mulheres que têm verdadeiro asco de seus maridos, mas têm de aguentar por Ns razões; outras nem sabem se gostam ou não, sempre foi assim, sempre será. Conheci mulheres que foram abandonadas por seus maridos por volta dos 40 anos de idade, depois de 15, 20 anos de casamento e dedicação (anulação) e que nunca tiveram um orgasmo na vida; outras que se separaram dos maridos por não suportarem a humilhação e os maus tratos, além de terem se cansado da mesmice do casamento. A maioria delas, com a autoestima em frangalhos, se recolheu à sua insignificância de mulher ruim de cama, que não sabe mexer com homem, que não soube segurar o marido; algumas, em número bem menor, se lançaram na vida, com medo e tudo, com autoestima destruída, mas foram. 

O que essas mulheres mais destacam em suas vidas depois da separação é a questão sexual, de como o sexo pode ser bom; duas delas descreveram, fascinadas, com riqueza de detalhes, como foi seu primeiro orgasmo: uma delas, professora universitária, com pós-graduação, estava com 40 anos de idade, era casada há 8 anos, e tudo aconteceu em uma relação virtual, com um homem 3 anos mais velho que seu marido, que há época estava com 37 anos. Depois disso, ela se lançou na vida real. Seu primeiro amante foi um homem de 55 anos de idade, ela, então, conclui: pela primeira vez na minha vida, eu vi como o homem fica quando ele realmente está com tesão por uma mulher, pela primeira vez eu me senti desejada, cuidada, amada e não apena comida, de quatro em quatro meses, por cumprimento de obrigação. Ela ainda ficou no casamento por mais 4 anos e só se separou porque descobriu que o então marido, embora mulherengo, desfilando publicamente sempre com moças jovens e bonitas, gostava mesmo era de rapazes, tudo não passava de uma farsa. Agora, ela está namorando e tendo muitos orgasmos, diz. A outra, com ensino médio incompleto, moradora do interior, distante da capital, enfermeira, teve seu primeiro orgasmo aos 38 anos de idade, depois de ser abandonada pelo marido de 45 anos, que estava namorando sua secretária, de 23 anos de idade, com curso superior: foi uma separação doída, professora, ele ficava me humilhando, falando que eu não prestava na cama, que num era mulher pra ele, que ele queria uma mulher de verdade; que mulher de 30 tem de ser trocada por duas 15, mas eu com quase quarenta, tinha ser trocada por duas de vinte. Esse discurso das idades pode ser contra-lido, atentando para a necessidade de mais de uma de 20, por exemplo, para substituir uma de 40, o que equivale a dizer que o valor da mulher de 40 é superior ao valor da mulher de 20. Enfim, na verdade, aquele homem estava desrespeitando as duas mulheres, a jovem e a madura. Mas, a jovem vê apenas as vantagens que ela tem aos 20 anos, o resto é desespero de mulher velha, abandonada e despeitada. 

É interessante a história de outra mulher que aos 18 anos se envolveu com seu professor (poderia ser o patrão, essas histórias são corriqueiras), um homem de 45 anos, casado, com dois filhos pequenos. O professor deixou sua família e foi viver com a jovem aluna. Ela teve com ele duas filhas e aos 28 anos de idade foi abandonada por ele, com as duas meninas ainda pequenas, ele já estava com outra aluna, de 20 anos: naquele momento, eu soube  o que a ex-mulher dele sentiu quando ele ficou comigo, naquele momento, eu soube o que eu tinha feito pra ela e pros filhos dela, eu chorei de pena dela e de mim, só que eu estava com 28 anos e a outra, coitada, foi deixada com mais de 40, praticamente sem chance na vida. Eu procurei a ex-mulher do dito professor, ela, aos quase 60 anos, está casada. Conheceu seu atual marido aos 45 anos, 5 anos depois de se separar: é uma relação saudável, com seus altos e baixo, mas muito respeitosa e equilibrada, ele foi quem me deu amor e me ensinou a fazer sexo e ter prazer e a gostar novamente de homem e de mim, ele é o pai que meus filhos tiveram, um companheiro

Ademais, há homens que são sexualmente mais ativos e há homens sexualmente mais passivos. Isso não quer dizer que os mais passivo sejam homossexuais, não confundamos as coisas. Conversei com vários deles e me relacionei com alguns, tanto + ativos quanto + passivos. Os + passivos são os dependentes de mulheres que sabem mexer com homem, a mulher tem de estimular, preparar e fazer quase tudo sozinha. Todos os homens, com quem conversei ou me relacionei, que podem ser caracterizados como + passivos são mais passivos em outros aspectos da vida, dependem do outro, seja mulher ou homem, pra tudo. Muitos deles declaram, por meio de algumas variantes, que mulher boa é a santa na rua e puta na cama; a mulher boa aceita tudo e faz tudo, sem cobrar nem encher o saco nem reclamar. Esses homens, todos casados, alguns já no terceiro casamento, se gabam de sempre ter tido muitas mulheres, porque casamento mata a vontade do homem, aí tem de ciscar fora, no começo, a mulher é até boa de serviço, depois ela parece que desanima, depois que tem filho então... aí tem que ir pras prima, né (risos), porque as prima são danada.

O homem + ativo pode até ser mulherengo também, uma coisa não tem nada a ver com a outra, mas ele comparece regularmente e dá conta do recado, sem essa de mulher ter de saber mexer com ele. Todo mundo, um dia pode estar mais pra baixo ou mais pra cima; pode querer em um dia um cafuné e no outro uma pegação. O interessante então é a relação baseada na troca e não na prestação de serviços, em que um serve e outro é servido. O perfil vampiro, sugador é também o perfil + passivo. É esse que se assusta com as poderosas, com as seguras. O + ativo não se assusta com nada e caiu na rede, é peixe, tá valendo.