quinta-feira, 22 de outubro de 2015

II ENCONTRO ENCONTRO SOCIOLINGUÍSTICO E CULTURAL DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS, CAMPUS DE CAMPOS BELOS

A convite da Professora Júnia Januária, estive em Campus Belos, no dia 21 de outubro, no II Encontro Sociolinguístico e Cultural da UEG-Campos Belos, evento organizado pela Professora Janne Kelly Janner e os/as estudantes do Segundo Ano de Letras. Proferi a palestra "Como falam os goianos?", com o objetivo de potencializar as atitudes sociolinguísticas positivas dos/as estudantes e dos/as professores/as de Pedagogia, Letras e Agronegócio com relação ao falar identitário do povo goiano. Abordei ainda questões relacionadas ao preconceito sociolinguístico e aos lugares destinados aos povos negros e indígenas na sociedade e na escola goiana de todos os níveis. Falei sobre o projeto de nação e de sociedade brasileiras sustentado pela persistência do "fracasso escolar" e da "má qualidade da educação". Toda a discussão foi subsidiada pela concepção de linguagem como cultura e forma participação e transformação social, pelo Paradigma da Complexidade e pelo Paradigma da Decolonialidade, sem muita teoria, afinal de contas a teoria e as concepções estavam vivas e gritando ali bem na minha frente. 

Antes da palestra, Felipe, o menino berrantero, de nove anos de idade, fez a abertura cultural do evento tocando o berrante igual "gente grande". Perguntei a ele: Felipe, quem te ensinou a tocar assim tão bem o berrante? E ele, prontamente, me respondeu: ninguém. Muito à vontade e com a tranquilidade de quem maneja aquele instrumento há décadas, Felipe fez soar novamente pelo salão do Rotary Clube o som divino dos boiadeiros e dos tangedores de gado. A "estratégia pedagógica" do "aprender de ouvido", adotada por Felipe  e, com certeza,  por toda aquela gente, e a sonora linguagem do berrante, ecoando pelos ares dos campos belos de Goiás, me transportaram dos conceitos teóricos para os céus e as grotas da Chapada dos Veadeiros, ainda em chamas e fumaças, embalada pela música do sertão. Ali, apreendi novas epistemologias; ali, entendi com plenitude o que são as "epistemologias do Sul" (Boaventura de Sousa Santos). Falar de linguagem como cultura e cultura como linguagem naquele contexto tornou-se uma prática dêitica, muito fácil de ser realizada, pois estávamos vivenciando o que a teoria nem de longe consegue descrever ou explicar ou mesmo problematizar. 

As alunas da casa também deram sua contribuição, apresentando uma dança, que representa exatamente o momento pelo qual a cultura goiana está passando: a reelaboração de suas práticas culturais, como as danças, as músicas etc., por meio da valorização das misturas entre vários ritmos e estilos de danças e músicas. A mistura, mais uma vez constatamos, é a base da formação do povo brasileiro (DaMatta) e a bastardia, a mistura ilegítima e estigmatizada, conforme a viram e conceituaram os cronistas viajantes do século XIX, dá a tônica da formação do povo goiano, que não se envergonha de ser o que é, embora reconheça constantemente que é estigmatizado.    


Houve, ainda na programação cultural, declamação de poesias, representações teatrais e apresentações musicais, também sob a perspectiva da mistura, e todas de acordo com o tema do evento. A criatividade pulsava em cada ato e em cada atividade. Em Campos Belos, a escola ainda não tem por projeto  a formatação dos/das estudantes.


E para fechar com chave de ouro cravejada de brilhantes, chegou o contador de causos da cidade: Vovô Mariano, encantado porque nessa noite, nós vamos  sair daqui tudo letrado. Enfim, foi uma noite muito produtiva, aprendi muito com  aquela "gente boa da Chapada". Um povo sábio, afetuoso e gentil. E ainda ganhei presentes maravilhosos.                                                                            
   

Com essa participação no evento de Campos Belos, dado o adiantado do ano, estou encerrando o ciclo de palestras sobre "Como falam os goianos" e daqui por diante quem quiser saber do assunto terá de aguardar a impressão e publicação do livro de mesmo título, que, já adianto, está ficando maravilhoso.