domingo, 10 de março de 2013

Pombinha, pombinhas...

...é loura, muito pálida, frágil e delicada, com uns modos de menina de boa família; é a flor do cortiço. Chamam-lhe Pombinha.


Maria da Penha foi espancada de forma brutal e violenta diariamente pelo marido durante seis anos de casamento. Em 1983, por duas vezes, ele tentou assassiná-la, tamanho o ciúme doentio que ele sentia. Na primeira vez, com arma de fogo, deixando-a paraplégica, e na segunda, por eletrocussão e afogamento. Após essa tentativa de homicídio ela tomou coragem e o denunciou. O marido de Maria da Penha só foi punido depois de 19 anos de julgamento e ficou apenas dois anos em regime fechado, para revolta de Maria da Penha com o poder público. 



Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. 

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. 
Acessada em: 5 mar. 2013.



A moça é preparada para se casar com um bom partido e ser uma boa esposa: zelosa, fiel e amante. 

- Você não precisa concordar com seu marido, basta deixá-lo pensar que concorda; você toma todas as decisões, mas deixe ele pensar que é ele quem está no comando; diga sempre o que ele gosta de ouvir e faça sempre o que ele gosta que faça; seduza seu homem, manipule-o, faça ele brigar e até matar ou morrer por você; faça TUDO pra segurar seu marido; assim, nunca precisará trabalhar para sobreviver, terá vida boa e ele sustentará até os seus luxos.

- Como fazer para suportá-lo e conseguir estar sempre bem ao seu lado?

- Simples, tenha sempre ao alcance um jovem e fogoso amante, nunca o mesmo, claro, troque sempre, a mesmice mata uma mulher. E se ele desconfiar ou descobrir, negue, ofenda-se, chore, chore muito, os homens são bobos, moles, e se derretem diante das lágrimas falsas de uma meretriz santinha que finge bem.

Os homens entram no jogo e se derretem pelas santinhas doces, meigas e chorosas. E tiram muito proveito da situação, claro! Com muito autoritarismo, chegando ao ponto de espancar e matar, por eles e não por elas. Atualmente, está fora de moda e é politicamente incorreto ser machista e maltratar mulher, o sexo frágil, além de ser crime. Os homens, agora, evoluíram, deixando de ser macho bruto para ser macho fino e sofisticado. A tortura que praticam contra a mulher é a tortura emocional e psicológica. Coisa pouca! No lugar de ficarem paraplégicas, as mulheres do século XXI sofrem de transtornos mentais e seus maridos, de vilões passam a vítimas. Isso é urbanidade!

Apesar disso, há mulheres que continuam sentadas no conforto da manipulação, talvez por necessidade, talvez por vício. Generalizam e se dissimulam pelo mundo a fora, como se estivessem na intimidade de suas alcovas. Essas são pálidas, frágeis, delicadas, com ares de moças de boa família - é claro que aqui e ali, não resistem e se permitem pequenas fraquezas, entregando-se ao melhor amigo de seu marido, geralmente, um compadre (tão corriqueiro isso), assediando um rapazinho bonitinho (mulheres nunca são acusadas de assédio sexual mesmo, êta mundo machista, né!), dando em cima do marido de uma amiga (ah, coitada, ela já tá cansada dele, vou dar uma ajudinha!) e, por aí vai. E o marido brigando com o mundo para defendê-la, porque ela é uma mulher tão ingênua, fala baixo, devagar e é tão ca ri nho sa... booooa!!!

A mulher-Pombinha, pálida, frágil, "oblíqua e dissimulada", odeia as feministas, odeia mulher segura, independente e dona de si. Mulher tem de ser feminina, delicada, tem de ser protegida, resguardada e muito, muito dissimulada, chorar nos momentos oportunos e envenenar sempre, fazer fofocas, lançar intrigas: isso sim é ser mulher! Essa nunca é maltratada, jamais é torturada, é tratada como uma princesa. A mulher-Pombinha é homofóbica, afinal todo ser do sexo masculino tem a obrigação de desejá-la e todo ser do sexo feminino tem a obrigação de ser igual a ela, embora a inveja e a disputa lhe provoquem atitudes pouco recomendáveis a uma dama.

Pombinha, a personagem intelectualmente evoluída de Aluísio Azevedo, se libertou e deixou de ser santa de porcelana para se tornar mulher de carne e osso. Ela não quis se submeter a TUDO para segurar o marido. Preferiu ser mulher, ainda que prostituta para a sociedade, a ser esposa, senhora e dama na sociedade, e prostituta às escondidas. Pombinha negou a hipocrisia social, moldada pelos valores de uma elite europeia decadente. Preferiu ser uma mulher Maria da Penha.

A mulher Maria da Penha é a personificação da ameaça à masculinidade insegura e frágil. Por isso, ela é maltratada, é usada, é explorada, é  espancada. Ela não manipula, enfrenta de cara limpa; é destemida; esbarra na morte e não esmorece; perde a locomoção e age; ela é guerreira, denuncia os abusos e os exageros, luta por justiça, mesmo injustiçada; a mulher Maria da Penha não se finge de frágil nem usa as conquistas e as leis que as mulheres levaram décadas para alcançar para justificar suas maledicências e manipulações. A mulher Maria da Penha se respeita como mulher.